Neste Dia Mundial da Saúde destacamos dois projetos cofinanciados pelo Camões, I.P.: Saúde para Todos – Rumo à Sustentabilidade, que atua em São Tomé e Príncipe gerido e implementado pelo Instituto Marquês de Valle Flôr IMVF), e o Programa Integrado para a Redução da Mortalidade Materna e Infantil(PIMI) na Guiné-Bissau, que conta com o IMVF na implementação da: Componente de Reforço da Disponibilidade e Qualidade dos Cuidados de Saúde Materno-infantis, e a participação da ONDG VIDA na implementação da prestação de cuidados Saúde Materno-infantis a nível comunitário.
Saúde para Todos – Rumo à Sustentabilidade
O projeto Saúde para Todos teve início em 2005, tendo ao longo do anos sido implementado em diferentes fases, e encontra-se agora na sua última fase - Rumo à Sustentabilidade. Tem como objetivo geral contribuir para manter o acesso universal da população da República Democrática de São Tomé e Príncipe a cuidados de saúde de qualidade e, especificamente, promover a melhoria, a autonomização e a progressiva sustentabilidade da prestação de cuidados de saúde preventivos, primários e especializados.
A Telemedicina, implantada no Hospital Central, tem permitido o acompanhamento e orientação dos casos clínicos complexos, a promoção, a formação e o aconselhamento à distância. Neste âmbito, foi desenvolvida uma solução inovadora, o sistema TELEYE, que permite a realização de exames oftalmológicos completos à distância, em tempo real ou diferido, apoio importante para a formação teórica e prática dos profissionais de saúde são-tomenses.
A Telemedicina é igualmente aplicada a outras especialidades médicas, como a oncologia e a otorrinolaringologia.
O projeto, com duração de 48 meses, que decorrerá até dezembro de 2020, tem como beneficiário a totalidade da população são-tomense, cerca de 187.356 habitantes, enquanto utilizadores do Serviço Nacional de Saúde, e profissionais do Serviço Nacional de Saúde (60 médicos e 348 enfermeiros) a beneficiar das ações de formação no país no decorrer das missões de especialidade e de Telemedicina, além de 8 profissionais de saúde a beneficiar de formação de longo curso em Portugal.
No âmbito do programa Saúde Para Todos, que decorre há três décadas, com o apoio da Cooperação Portuguesa, Fundação Calouste Gulbenkian, Direção Geral da Saúde de Portugal, União Europeia e em estreita parceria com o Governo de São Tomé e Príncipe, o Serviço de Saúde, outrora pouco eficaz, é hoje um Serviço de Saúde descentralizado que abrange a totalidade do território e da população de São Tomé e Príncipe.
Oiça aqui testemunhos relativos ao Saúde para Todos – Rumo à Sustentabilidade
Celeste Alves, médica radiologista do Centro Clínico Champalimaud (Fundação Champalimaud) e chefe da missão da especialidade de Imagiologia, no âmbito das missões médicas a São Tomé e Príncipe no quadro do programa, recorda num testemunho que, na primeira missão de imagiologia ao país, em 2010, procurando fazer a avaliação das condições no serviço de radiologia do Hospital Dr. Ayres de Menezes, “o impacto da avaliação inicial foi de Missão Impossível, tais as carências encontradas!”
No entanto, como descreve no seu testemunho, “cerca de 6/8 meses após a avaliação inicial, o espaço foi requalificado e foi montado um novo serviço de radiologia, com tecnologia digital, acompanhada de formação e qualificação do Corpo Técnico e treino de um médico local na aquisição de imagens de ecografia, que permitissem a leitura especializada à distância.”
A médica radiologista considera que “A Telemedicina foi o grande motor do desenvolvimento da assistência médica especializada, ao permitir o acesso a especialidades médicas e cirúrgicas, que não existiam e continuam a não existir no país.”
No âmbito do projeto, foi instalado, em 2013, o primeiro mamografo. No ano seguinte seria feita a primeira consulta de Tele-Oftalmologia (TELEYE), com o exame oftalmológico em tempo real a ser avaliado pelo especialista em Portugal. Seguir-se-iam as consultas de Tele-Otorrino e Tele-Oncologia.
Cristina Carroça, médica que integra as missões de Otorrinolaringologia, relata: “As missões não terminam quando regressamos a Portugal, mantém-se todas as semanas, através da ligação por telemedicina, em que a 4600km se avalia, discute e decide casos clínicos, contribuindo igualmente para a capacitação dos profissionais são-tomenses.”
Miguel Correia, médico que integra as missões de Dermatologia do Saúde para Todos, recorda que as missões de dermatologia no âmbito do programa começaram em 2008. “ Consultas e cirurgias no Hospital Ayres de Menezes e nos diferentes centros de saúde da ilha permitiram o acesso a cuidados de saúde nesta especialidade à população. A intensidade da procura revelou como são comuns os problemas de pele em São Tomé e Príncipe. Para melhorar os cuidados prestados e melhor os adaptar à população local foi feito em 2018, em São Tomé, um encontro de dermatologistas de Portugal, Angola e Moçambique. Deste encontro nasceu o projeto de estabelecer no Hospital Ayres de Menezes o serviço de dermatologia, assente em médicos locais, com respaldo permanente via telemedicina e apoio formativo de especialistas destes três países. Assim se passou de ação assistencial para a capacitação local em cuidados de saúde numa especialidade até ao momento inexistente no país apesar da carga de doença dermatológica ser elevada”.
Entre 2008 e 2019 o programa Saúde para Todos permitiu realizar, em termos de cuidados especializados, mais de 41 mil consultas, 6 mil cirurgias, 400 sessões de formação; 60 mil exames complementares de diagnóstico, 815 missões (especialista-missão), 90 mil exames e arquivos clínicos em Telemedicina, 5 mil sessões clínicas via Telemedicina, 28 Programas de formação de longo-prazo em Portugal. Estes atos clínicos e de formação foram realizados em parceria com cerca de 50 instituições de saúde em Portugal.
PIMI II – Programa Integrado para a Redução da Mortalidade Materna e Infantil: Componente de Reforço da Disponibilidade e Qualidade dos Cuidados de Saúde Materno-infantis
Para dar resposta às dificuldades do sistema de saúde na Guiné-Bissau no que diz respeito à saúde materno-infantil, e tendo em conta os resultados revelados pelos indicadores, a União Europeia concebeu o Programa Integrado para a Redução da Mortalidade Materna e Infantil (PIMI), que começou por ser implementado nas Regiões Sanitárias de Cacheu, Biombo, Oio e Farim de julho de 2013 a novembro de 2016 e, no âmbito do atual PIMI II, foi alargado à totalidade das regiões sanitárias da Guiné-Bissau.
O PIMI II tem como beneficiários diretos mais de 320 mil crianças até 5 anos de idade e mais de 400 mil mulheres em idade fértil na totalidade das regiões sanitárias da Guiné-Bissau. Os beneficiários indiretos são mais de 1200 profissionais de saúde afetos às 132 estruturas sanitárias e cerca de 1.881.005 habitantes das 11 regiões sanitárias do país.
O programa, cuja segunda fase tem duração de 48 meses, até maio de 2021, tem como objetivo global contribuir para a redução das mortalidades materna, neonatal e infanto-juvenil na Guiné-Bissau e, em particular, para o alcance das metas traçadas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Especificamente, procura assegurar um melhor acesso a cuidados de saúde de qualidade a mulheres grávidas e puérperas (até 45 dias após o parto) e crianças até aos 5 anos na Guiné-Bissau.
Veja aqui os testemunhos relativamente ao programa.
O PIMI II encontra-se totalmente alinhado com as prioridades do Documento Estratégico Nacional de Redução da Pobreza II (DENARP II). Encontra-se igualmente enquadrado nos objetivos e eixos de intervenção do Plano Operacional de Passagem à Escala Nacional das Intervenções de Alto Impacto relativamente à redução da mortalidade materna e infantil na Guiné-Bissau (POPEN).
A intervenção está estruturada em três pacotes de cuidados, prestados de forma integrada a mulheres e crianças, antes e durante períodos de alto risco tais como gravidez, parto, período de pós-parto e pequena infância (até aos 5 anos) – Práticas Familiares Essenciais, Pacote Mínimo de cuidados e Pacote Complementar de cuidados.
Tendo em conta a experiência do programa anterior, o PIMI II tem como prioridade o reforço do Sistema Nacional de Saúde Guineense, nomeadamente das competências clínicas e técnicas dos quadros de saúde locais, através da formação de uma nova geração de profissionais guineenses capazes de dar resposta às necessidades assistenciais no país, criando, simultaneamente, condições de adaptação a situações de emergência humanitária e garantindo uma progressiva autonomização e sustentabilidade da prestação de cuidados de Saúde Materno-Infantil na Guiné-Bissau. Este trabalho de reforço de competências está a ser feito em estreita colaboração entre médicos guineenses, portugueses e cubanos.
Dados atualizados do 1.º trimestre de 2019 mostram que a evolução dos principais indicadores de desempenho clínico revela-se positiva, excedendo, já, em alguns casos as metas estabelecidas para o fim do projeto. Numa escala nacional, 58% das grávidas frequentaram as quatro consultas pré-natais; em 89% das crianças com menos de cinco anos com pneumonia esta foi devidamente diagnosticada, classificada e tratada de acordo com o manual Atenção Integrada às Doenças da Infância (AIDI); em 96% de crianças menores de 5 anos com diarreia esta foi devidamente diagnosticada, classificada e tratada de acordo com o manual AIDI; 94% dos partos tiveram partograma corretamente preenchido. Os indicadores de iniciativa de qualidade revelaram também evolução positiva, nomeadamente aquele que revela que 93% das grávidas com Alto Risco Obstétrico foram devidamente identificadas e classificadas na Consulta Pré-Natal.
A organização não-governamental VIDA tem igualmente desenvolvido projetos de Saúde Comunitária na Guiné-Bissau (PIMI I e PIMI II), nomeadamente através dos Agentes de Saúde Comunitária (ASC) que atuam na articulação com o sistema de saúde para a evacuação e tratamento, chegando de forma mais próxima às famílias e identificando situações graves, na sensibilização para a prevenção, promovendo a mudança de comportamentos e na proximidade com a comunidade, facilitando relações de confiança com as famílias.
“Conheci uma família que tinha uma criança com desnutrição grave em casa. Acontece que a família, talvez por razões económicas, não a queria levar até ao centro de reabilitação, para onde são evacuadas as pessoas com desnutrição grave. Graças a um ASC chamado Carlito que sinalizou a criança, conseguimos conversar com a família e evacuar essa criança, que agora está saudável. Agora, quando o ASC passa, a família reconhece sempre e agradece.”, conta Jó Sambi, supervisor operacional no terreno (região de Biombo).
Alfu Sene , supervisor operacional no terreno (setor autónomo de Bissau), afirma: “Este trabalho [dos ASC] ajuda muito a mudar o comportamento da comunidade, porque existem certos mitos, por exemplo, quando uma criança nasce com má formação congénita, as pessoas associavam isso à magia negra, mas os ASC trabalharam nessa desmistificação, e isso ajudou. As PFE 5, 6 e 7 foram hino dos ASC [lavagem de mãos com água e sabão ou cinza em momentos críticos; utilização de latrinas funcionais; e tratamento da água de consumo com lixívia ou comprimidos de cloro], porque foram as primeiras práticas que começaram a trabalhar… Um dia, eu fui visitar uma casa, e vi uma criança que foi assistida desde início por um ASC. A criança quando me viu, disse: «Está aqui aquele senhor que nos ensinou a lavar as mãos» e a mãe confirmou-me que agora aquela criança não come sem lavar as mãos, e que cada vez que vai à casa de banho utiliza sabão para depois lavar as mãos.”